Neste mês de julho, a Cinemateca do MAM comemora 60 anos e ganha um presente estimulante: seu novo curador é o crítico de cinema e gestor Ricardo Cota, que ocupa a partir de agora o lugar de Gilberto Santeiro, recentemente falecido. Cota milita na crítica há pelo menos 30 anos, com passagens pela saudosa revista Cinemin, o Jornal do Brasil e a revista IstoÉ. Atualmente assina colunas semanais nos jornais O Dia e Brasil Econômico. Tem feito coberturas regulares dos festivais de Cannes e Berlim para o site Críticos.
Nos últimos oito anos, ele esteve à frente da área de Comunicação do governo do estado, o que o fez circular com desenvoltura entre as áreas de cultura, política e economia. Como se não bastasse o conhecimento de cinema, essa experiência na gestão o credencia ainda mais para o desafio de tirar a Cinemateca do MAM do imobilismo que a caracteriza nos últimos tempos.
Ricardo Cota conversou com o blog tão logo seu nome foi confirmado no novo cargo.
– Como você recebeu o convite para ser o novo curador da Cinemateca?
RC – O convite partiu do Presidente do Museu de Arte Moderna, Carlos Alberto Chateaubriand, e me deixou muito dividido entre a felicidade e a responsabilidade. Sem dúvida, é uma honra ser responsável por uma curadoria de cinemateca, cargo que Paulo Emílio Salles Gomes tanto soube definir como enobrecer quando curador da Cinemateca Brasileira. Por outro lado, as imensas dificuldades do cargo impõem uma responsabilidade que irá testar limites que com certeza irão me desafiar como gestor e ser humano. Mas topei.
– Você está ocupando o lugar que era do Gilberto Santeiro. O que isso significa em termos administrativos e de curadoria?
RC – Significa uma mudança radical. A Cinemateca encontra-se em estado de grande precariedade. As condições de trabalho dos poucos funcionários que ali se encontram são as piores possíveis.  É inadmissível que um museu da dimensão do MAM, que leva numa exposição mais de um milhão de visitantes, não consiga atrair sequer 100 espectadores para a Cinemateca. Minha missão será tentar romper o vão que separa a Cinemateca do Museu de Artes Plásticas. O objetivo não é apenas enobrecer a Cinemateca, mas enobrecer o Museu e o espaço que ele representa dentro da cultura do Rio de Janeiro.
– Quais suas principais preocupações no que diz respeito a restaurar o prestígio da Cinemateca?
RC – Oferecer uma sala que seja referência no Rio de Janeiro. Existe um clima muito favorável a isso na cidade. O Estação Botafogo se reergueu, o Joia tornou-se uma realidade, o Instituto Moreira Salles está aí e o Centro Cultural Luiz Severiano Ribeiro – Cine Odeon acendeu a chama no centro da cidade. A Cinemateca hoje não é mais a protagonista cultural das décadas de 60 e 70.  Ela precisa reconhecer que perdeu terreno e se aproximar das novas iniciativas. Atualizar-se, enfim.
– Que recursos e parcerias estão sendo considerados para a reativação das atividades?
RC – Ainda não foi definida uma linha de ação neste sentido. É preciso em primeiro lugar fazer um diagnóstico para saber o que será exigido. No que diz respeito às parcerias, todas estão sendo consideradas. A Cinemateca não pode ter medo da nova realidade do mercado. Isolar-se é destruir-se. Se não existem parcerias públicas, é preciso recorrer aos investidores privados, desde que os princípios da Cinemateca não sejam violados, mas sim valorizados. O Festival de Cannes não se envergonha da L’Oréal, assim como o de Berlim não se envergonha da Sony, que por sinal propicia uma das melhores projeções do mundo.
– A formação do acervo será retomada ou essa não será uma intenção imediata?
RC – Sobre isso já conversei com Hernani Heffner, que é uma das maiores autoridades brasileiras no assunto. Ele é realista e afirmou que no momento a ideia de aumentar o acervo no que diz respeito ao passado é inviável. O importante é a Cinemateca não abdicar do que está sendo feito no presente. E digitalizar a documentação, que é riquíssima.
– Em termos de programação e acesso, como a Cinemateca poderá recuperar seu papel na cultura da cidade?
RC – O desafio da programação passa pela inovação tecnológica da sala. Hoje a Cinemateca é refém do 35mm, que tende a desaparecer. Mas é importante que isto, que hoje parece um problema, seja visto como um atrativo no futuro.  A Cinemateca tem dois excelentes projetores de 35mm que ainda durarão um bom tempo. Enquanto existirem cópias, os projetores serão preservados. Mas não há digitalização da sala, o que inviabiliza o futuro da Cinemateca. Esta hoje é a principal preocupação, digitalizar a sala. Sem isso, a Cinemateca vira artigo de museu.
– Em julho a Cinemateca comemora 60 anos e haverá a estreia do filme Tudo por Amor ao Cinema, sobre Cosme Alves Neto, seu lendário ex-curador. Até lá já poderemos contar com a Cinemateca funcionando sob a nova direção?
RC –  Esta é a primeira meta. Vamos fazer uma pré-estreia do filme do Aurélio Michiles no dia 14, no contexto dessa comemoração. Vamos à luta.